Cartazes colados em pontos de ônibus ofendem jornalista negra e lésbica do RJ
  • 06.07
  • 2022
  • 17:00
  • Abraji

Liberdade de expressão

Cartazes colados em pontos de ônibus ofendem jornalista negra e lésbica do RJ

A jornalista Renata Cristiane de Oliveira, colunista de O Dia e diretora do portal RC24h, recebeu um aviso na sexta-feira (1.jul.2022), em São Pedro da Aldeia, região dos Lagos. Cartazes pregados em pontos de ônibus escritos a mão e com erros de português a chamavam de "macaca". Mulher, negra e lésbica, Renata escreve sobre o entorno de Cabo Frio há 20 anos e sofre, pela internet, toda sorte de agressões racistas, de gênero e orientação sexual pela internet.

Oliveira encontrou duas folhas de caderno coladas em dois pontos de ônibus próximos ao Pronto Socorro de São Pedro da Aldeia. “Tentei arrancar os cartazes, mas havia muita cola. Tive que pegar um colorjet [tinta em spray] e passar por cima para apagar a manifestação de ódio”, contou ela à Abraji. Os autores das ofensas não haviam sido identificados até a tarde de quarta-feira (6.jul.2022).

A jornalista afirmou que os ataques nas redes sociais têm se intensificado no período pré-eleitoral e que tem tratado o tema com discrição. “Tento não dar palco para esse tipo de ofensa, mas quando a coisa sai das redes para o ponto de ônibus não dá para ignorar”.

A repórter afirmou que os casos de racismo em São Pedro da Aldeia são recorrentes. Em 21.jun.2022, um jovem aldeense foi alvo de injúrias raciais no Instagram após participar da gravação de um podcast. “Esse neguin [sic] sai do podcast e já vai assaltar um pai de família”, escreveu uma conta sob o nome de Gabriel Silva, sem fotos ou mais dados, sobre a participação do ativista social e universitário Wagner Muniz, colunista do RC24h.

Por recomendação da Abraji, Oliveira afirmou que registrará boletim de ocorrência sobre o ataque racista do qual foi alvo. Ela disse ter contatado a 125ª Delegacia de Polícia, de São Pedro da Aldeia, mas ouviu que seria difícil identificar o autor dos cartazes sem mais evidências.

Procurada, a Polícia Civil do Rio de Janeiro afirmou que a ocorrência precisa ser devidamente registrada para que haja um posicionamento do órgão.

Em sua página no Facebook, o prefeito de São Pedro da Aldeia, Carlos Fábio da Silva (PODE-RJ), mais conhecido como Fábio do Pastel, repudiou manifestações de racismo na cidade, sem citar o nome de Oliveira. “Recebi com tristeza a informação sobre manifestações racistas em um cartaz fixado em via pública no nosso município. Isso é inaceitável!”

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) emitiu nota de repúdio ao ataque que considerou racista e homofóbico. “O Sindicato dos Jornalistas, além de lamentar, denunciar, combater qualquer ato de violência, assédios, preconceito, homofóbico, racista, solicita às instituições públicas policiais e de Direitos Humanos, assim como a OAB, apoio para coibir tais atitudes abomináveis e punir os responsáveis”.

Em 2020, a Abraji, por meio de consórcio com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), acompanhou ataques difamatórios do deputado estadual Mauro Bernardo Oliveira (DC-RJ), gravados em vídeo, contra Renata Cristiane Oliveira. A profissional foi chamada de mentirosa pelo político após republicar reportagem da Veja sobre os parlamentares que compunham a base política do então governador Wilson Witzel. Não há menções sobre a revista, apenas sobre a publisher do RC24h.

À publicação do deputado, seguiram-se áudios, em tom de ameaça, enviados anonimamente a Oliveira. “Renata Cristiane, os ossos do seu corpo estão com os dias contados. O Bernardo vai quebrar, vai desossar seu osso todinho [sic]”, afirmava uma das mensagens.

Com auxílio da OAB, Renata Cristiane Oliveira entrou com ação criminal de difamação contra o parlamentar. Em mai.2022, houve audiência no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em que a jornalista, aconselhada pelo Ministério Público, aceitou acordo com Mauro Bernardo Oliveira.

Ficou determinado que o deputado estadual deveria gravar um vídeo de retratação declarando que ele havia se excedido nas palavras e que o portal RC24h e a jornalista exercem um trabalho de credibilidade.

Segundo a profissional de imprensa, o material que o político publicou na sequência com declaração de que a queixa havia sido retirada não atendeu aos critérios acordados. A defesa da jornalista entrou com nova petição afirmando que aceitaria o acordo, mas apenas se o parlamentar cumprisse com sua parte.

“Estou emocionalmente exausta com tudo isso. É ataque de todo lado”, disse Oliveira. Mas, como escreveu em suas redes sociais, ela não vai desistir de ocupar seu lugar na imprensa.

A Abraji faz o monitoramento de ataques a jornalistas no ambiente físico e nas redes sociais. As agressões têm escalado. O relatório de monitoramento dos ataques a jornalistas  com os dados de 2021 integra o Relatório Sombra da rede Voces del Sur, que reúne informações de 14 países da região. No Brasil, no ano passado, foi registrado um crescimento de 23,4% em relação a 2020, chegando-se a 454 registros de janeiro a dezembro de 2021. A Abraji também monitora ataques com viés de gênero.

 

Assinatura Abraji