Acesso a informações privadas de interesse público no Brasil é difícil, mostra estudo
  • 04.09
  • 2017
  • 11:25
  • Marina Atoji

Acesso à Informação

Acesso a informações privadas de interesse público no Brasil é difícil, mostra estudo

No aniversário de 10 anos do Mapa de Acesso a Informações Públicas, completados em 2017, a Abraji verificou se informações privadas de interesse público estão ao alcance da sociedade. O Mapa testa anualmente a efetividade do acesso a informações no Brasil por meio da transparência passiva.

Após mais de 100 pedidos de informação serem submetidos a 32 órgãos e entidades do Executivo federal, o levantamento reuniu e disponibilizou mais de 100 arquivos com dados cadastrais e informações que empresas e outras instituições privadas fornecem ao poder público por obrigação legal ou para fins de controle. Estão nos arquivos, por exemplo, a lista de farmácias cadastradas do recém-extinto programa Farmácia Popular e os medicamentos oferecidos por ele.

O volume de informação obtido não quer dizer que o acesso a ela é fácil: 36,5% das primeiras respostas aos pedidos foram insatisfatórias ou negativas; 29% foram apenas parcialmente satisfatórias. Apenas depois um ou mais recursos pedindo a revisão das respostas foi possível obter 43% de retornos satisfatórios.

As respostas foram consideradas insatisfatórias quando, além de não trazer os dados solicitados, não traziam justificativa válida para a negativa. As respostas parcialmente satisfatórias continham apenas parte dos dados e uma justificativa válida para o não fornecimento dos demais, ou continham os dados em formato diferente do pedido.

“Uma das principais dificuldades foi obter os dados abertos, ou seja, de forma que pudessem ser manuseados”, aponta Marina Atoji, gerente-executiva da Abraji e uma das coordenadoras do levantamento. Em 6% dos casos, as informações foram fornecidas em PDF, mesmo quando estavam em uma planilha -- dificultando, assim, sua análise. 

A ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) foram responsáveis pela maioria dessas respostas. 

Dos 4 pedidos apresentados à ANTAQ, todos foram respondidos com PDFs. No IBAMA, 4 dos 10 pedidos apresentados foram respondidos com planilhas em PDF.

Depois de apresentado recurso contra a resposta por estar em formato fechado, apenas 2 dos 17 pedidos resultaram em dados em planilha eletrônica. Em quatro casos envolvendo ANCINE, IBAMA e Ministério da Fazenda, os recursos nem sequer foram admitidos, pois os órgãos consideraram não haver amparo legal para fornecer as informações em formato diferente do já entregue. 

As negativas de acesso foram fundamentadas em sigilos variados: fiscal, industrial, segurança pública. O IBAMA, por exemplo, negou a lista de pessoas jurídicas que obtiveram o Documento de Origem Florestal (DOF) sob a justificativa de que os dados podem lesar a livre concorrência.

O DOF é uma “licença obrigatória para o controle do transporte de produto e subproduto florestal de origem nativa”. Para Marina Atoji, o não fornecimento da lista de quem tem essa licença prejudica o controle social da atividade e o consumo responsável: “como eu posso conferir se a empresa que está prestando um serviço ou fornecendo um produto tem a devida licença para funcionar?”, questiona.

As respostas ao Mapa de Acesso revelam também dificuldade no tratamento do sigilo de dados pessoais. Um dos pedidos feitos à ANTT foi a lista de motoristas de transporte de passageiros contendo nome, empresa em que trabalham e seus CPFs. A solicitação se baseou na existência, no site da Agência, de um sistema de consulta por meio do qual era possível obter esses dados.

Em resposta, o órgão forneceu as informações menos os CPFs, alegando justamente proteção de dados pessoais. Como provocação, foi protocolado um recurso, apontando que os dados estavam disponíveis para consulta. “Foi só aí que a ANTT se deu conta de que divulgava ativamente os CPFs de motoristas de ônibus interestaduais -- uma informação pessoal que deveria estar protegida”, conta Atoji. Atualmente, o sistema de consulta está indisponível.

Acesso a informações melhorou

Para Ivana Moreira, também coordenadora do estudo, é importante apontar que o panorama do acesso a informações no Brasil tem melhorado. Moreira contribuiu na elaboração de todos os Mapas de Acesso anteriores e observa que tanto a resposta do poder público quanto o interesse de jornalistas e da sociedade sobre o tema cresceram ao longo dos 10 anos. “Na primeira vez em que apresentamos o Mapa, havia umas cinco pessoas na sala; hoje, ela está quase cheia -- e isso já é uma conquista” disse ela, durante a apresentação dos resultados do levantamento no Congresso da Abraji.

O destaque positivo do levantamento em 2017 ficou por conta da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). O órgão forneceu todos os dados solicitados em formato de planilha eletrônica, o que permite análises e estudos. Entre eles, a taxa de adimplência de planos de saúde com o SUS e a lista de planos de saúde cuja comercialização está suspensa.

Os pedidos e os dados

Todos os pedidos feitos e as respostas obtidas (incluindo as bases de dados) estão disponíveis para uso livre no Achados e Pedidos, portal criado pela Abraji e pela Transparência Brasil para reunir solicitações de informação e respectivas respostas.

O relatório completo do Mapa de Acesso a Informações Públicas está disponível aqui.

Assinatura Abraji