Abraji reforça direito de gravar abordagens policiais, após detenção de jornalista no Rio
  • 20.02
  • 2020
  • 13:30
  • Abraji

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Abraji reforça direito de gravar abordagens policiais, após detenção de jornalista no Rio

A abordagem da Polícia Militar do Rio de Janeiro, na noite de quarta-feira (19.mar.2020), que envolveu o comunicador e ativista Raull Santiago, na Avenida Brasil, no Complexo da Maré, levanta discussões sobre a legalidade de gravar abordagens feitas por forças de segurança. Santiago foi detido depois de registrar, ao vivo, pelo celular, a ação do Batalhão de Choque. 

Gravar ações policiais não configura crime. De acordo com a Constituição Federal, todo cidadão tem o direito de gravar o que quiser em espaços públicos, em especial em momentos de interesse de toda a sociedade, que tem direito à informação (art. 5o, IV, VIII e IX e art. 220).

Santiago é comunicador independente, ativista e faz parte dos coletivos Papo Reto e Coletivo Movimentos. É também integrante da Assembleia de Membros da Anistia Internacional do Brasil. Ele classifica a ação como uma criminalização da juventude negra e favelada.

Segundo o comunicador, por volta das 19h30, ele e dois amigos saíram da Maré para celebrar os 31 anos dele, no Complexo do Alemão. Os três estavam em três mototáxis. No caminho, o grupo foi abordado por PMs do Batalhão de Choque. Santiago se identificou como jornalista comunitário, assim como Lana Souza, fundadora do Papo Reto. O ator e professor de teatro Ricardo Fernandes também apresentou os documentos. 

“Cheguei a mostrar meu passaporte e minha carteirinha da Front Line Defender, que busca proteger defensores de direitos humanos. Ficamos vendo a abordagem ao Renato e ao Tiago Purificação (mototaxista), a 40 metros da gente. Percebemos a truculência dos PMs. Observamos que não era uma abordagem padrão. Como trabalho com questões de segurança pública nas comunidades, sei os limites de ações extrajudiciais. Disse a eles, por exemplo, que não podiam mexer no celular da pessoa sem mandado”, afirmou.

De acordo com Santiago, nesse momento ele resolveu transmitir ao vivo a ação pelo Twitter. Afirmou que depois foi empurrado e teve o celular apreendido. Segundo ele, a partir daí, os PMs intensificaram a abordagem e começaram a ameaçá-lo: se não parasse de gravar, todos seriam detidos por desobediência e resistência. O comunicador disse ter aproveitado a presença de testemunhas no local para afirmar, em voz alta, que queria ser levado à delegacia para registrar Boletim de Ocorrência contra os PMs.

“Foi uma abordagem de cunho racial e criminosa. Coloca a gente naquele  estereótipo do jovem negro saindo de moto da favela. Quando chegamos à delegacia, os PMs já tinham dada outra versão”.

Em uma rede social, a Anistia Internacional disse que Santiago é “uma das vozes que inspira e orienta a missão de exigir do Estado o respeito e a proteção de todos e todas nós, sem distinção”.

Impedir que um cidadão — seja comunicador ou não — registre uma ação policial fere o direito à informação e descumpre a Declaração de Princípios Sobre Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da qual o Brasil é signatário.

A lei internacional assegura que “as leis de privacidade não devem inibir nem restringir a investigação e a difusão de informação de interesse público”, acrescentando ainda que os funcionários públicos estão sujeitos a maior escrutínio da sociedade. Para compreender mais sobre o tema, é possível acessar este guia produzido pela Artigo 19 em 2014.

A Assessoria de Imprensa da Polícia Militar no Rio declarou que os abordados se mostraram incomodados e não colaboraram. 

“Em determinado momento, diante da reação dos envolvidos e visando resguardar as suas próprias condutas, todos foram encaminhados para 21ªDP a fim de registrar a ação”, afirma o comunicado, que continua: “a Corporação esclarece que a abordagem é uma das principais ações preventivas voltadas para a redução dos índices criminais e transmissão de maior sensação de segurança. Reconhecemos o desconforto causado, mas destacamos que a colaboração da população a este tipo de serviço, agiliza a ação e a torna mais segura e efetiva”.

Assinatura Abraji