
- 16.12
- 2025
- 10:10
- Samara Meneses
Liberdade de expressão
Acesso à Informação
Abraji apresenta embargos de declaração ao STF sobre decisão que altera Marco Civil da Internet
A Abraji apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) embargos de declaração pedindo que a Corte esclareça pontos considerados incompletos no julgamento que redefiniu a responsabilidade das plataformas digitais no país. A decisão, tomada em junho, considerou parcialmente inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil da Internet, norma que, por mais de uma década, condicionou a responsabilização de provedores pelo conteúdo de terceiros ao descumprimento de ordem judicial de remoção de conteúdo.
A entidade participa do caso na condição de amicus curiae. Para a Abraji, ajustes na redação final do acórdão são necessários para garantir maior transparência e proteção à liberdade de expressão. Outras dez organizações que também atuam no caso como amicus curiae apresentaram embargos ou pedidos de explicações trazendo ponderações sobre riscos e dúvidas acerca da decisão da Corte. A Abraji é representada pelas advogadas Taís Gasparian, Mônica Galvão e Carina Lima, do escritório RMG Advogados.
No julgamento, o STF concluiu que o modelo original do Marco Civil já não responde aos desafios atuais da desinformação e das violações de direitos na internet. A Corte estabeleceu novos parâmetros de responsabilização das plataformas em três frentes: crimes contra a honra, crimes graves (como terrorismo, tentativa de golpe e racismo) e crimes e ilícitos em geral.
Um dos principais pontos apresentados pela Abraji é a falta de definição de quais tipos de provedores estão sujeitos às novas regras, já que a tese menciona apenas algumas categorias de plataformas. Para a associação, isso pode gerar desigualdade regulatória. A decisão deveria explicitar que a lista de provedores é exemplificativa e indicar que os provedores neutros, incluindo os de hospedagem, devem seguir a regra do artigo 19 do Marco Civil.
A entidade também destaca a ausência de referência a microempresas, pequenas empresas e plataformas com menos de 10 milhões de usuários. E defende que estas não deveriam ser obrigadas a cumprir deveres adicionais como relatórios de transparência e sistemas internos de notificação.
A Abraji questiona ainda a falta de definição sobre quais informações as plataformas podem exigir de quem pede a remoção de conteúdo e quem está legitimado a fazer essas notificações. Sem parâmetros claros, afirma a associação, podem surgir barreiras burocráticas que dificultam o exercício de direitos. A entidade também pede que o STF estabeleça um prazo para a adaptação das plataformas às novas obrigações, para evitar interpretações divergentes e garantir segurança jurídica.
Outro foco do recurso é a menção apenas a "crimes contra a honra", ignorando as ofensas civis, também relacionadas à honra, que não configuram crime, mas são extremamente relevantes para jornalistas e veículos de imprensa.
As primeiras versões das teses apresentadas por ministros, como Luís Roberto Barroso e Flávio Dino, incluíam expressamente a expressão “ofensas e crimes contra a honra”. No entanto, esse termo desapareceu do texto final — mudança considerada pela Abraji um desvio que pode gerar insegurança e interpretações restritivas.
Por fim, a Abraji também destaca que a decisão final foi extremamente complexa trazendo uma série de deveres adicionais e que a Corte deveria estabelecer um prazo para a adequação dos agentes implicados pela decisão, mesmo depois que essa tese se torne definitiva, ou seja, depois do trânsito em julgado da decisão.
Os pedidos ao STF
A Abraji solicita que o Tribunal:
- esclareça a aplicação do art. 19 também às ofensas civis contra a honra;
- declare que o rol de provedores citado na tese é exemplificativo, esclarecendo o artigo 19 do MCI é aplicável às plataformas neutras, inclusive de hospedagem;
- explicite que obrigações adicionais não se aplicam a pequenas empresas e plataformas com menos de 10 milhões de usuários;
- detalhe quais informações podem ser exigidas de notificantes e quem tem legitimidade para notificar;
- estabeleça um prazo claro para adequação das plataformas;
- e republicar os acórdãos com todos os votos, sobretudo o da ministra Cármen Lúcia.
O julgamento do STF é considerado a decisão mais impactante sobre liberdade de expressão desde a criação do Marco Civil. Os embargos da Abraji refletem a preocupação da sociedade civil com a precisão jurídica da tese e seus efeitos sobre o jornalismo. A Corte deve agora analisar o recurso e decidir se os esclarecimentos pedidos serão incorporados ao entendimento final.
*Crédito foto: Fellipe Sampaio /STF