• 19.06
  • 2008
  • 15:20
  • Alunos de jornalismo do UNI-BH

3º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo - sexta-feira, manhã

Cobertura das palestras de sexta-feira (09/5)  feita por alunos de jornalismo do UNI-BH durante congresso realizado em Belo Horizonte - maio de 2008

Direito de acesso

Renata Ferri

O seminário contou com apresentações de Maíra Magro, jornalista coordenadora da ONG Artigo 19, Katherine Funke, repórter do jornal baiano A Tarde, e Fernando Paulino, coordenador do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas.

Maíra iniciou, esclarecendo que o Artigo 19 é uma organização de direitos humanos, independente, e que ajuda a estabelecer padrões de direito à informação. Segundo ela, o direito de acessar (saber) sobre o que é feito, e o que não é feito por nosso governo precisa existir, pois assim será possível combater a corrupção, exaltar a democracia, e permitir que jornalistas produzam matérias e notícias fundamentadas.

De acordo com Maíra, os meios de comunicação são o principal meio de acesso da população aos dados e estatísticas de nosso país. Por isso, é essencial que o jornalista tenha essas informações disponíveis, e que essa disponibilidade seja garantida por lei.

O Brasil é um país que ainda não tem uma lei que regulamente a garantia de acesso à informação, porém, é algo cuja aprovação está em processo de discussão. Esse direito faz parte dos direitos humanos e pode ser requerido por qualquer pessoa, sem que seja preciso uma explicação. Caso o país não conceda as informações, é possível apelar para uma corte internacional.

Segundo Maíra, o direito à informação é sinônimo de uma boa governança, pois a transparência deve existir. Ela conta que o Artigo 19 tem como princípio a máxima de que "a informação é o oxigênio da democracia".

Katherine Funke apresentou um trabalho desenvolvido pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) em que cartas foram enviadas a câmaras legislativas e prefeituras de todos os estados brasileiros, requerendo informações sobre gastos públicos. As cartas foram baseadas em argumentação jurídica, citando artigos e leis que defendem o direito à informação.

Em 2007, apenas 5,8% dos órgãos contatados forneceram os dados solicitados de forma integral. E em 2008, 5,7% dos órgãos e prefeituras procurados forneceram informação completa. A razão alegada, na maioria das vezes, é segurança do estado.

Fernando Paulino finalizou a palestra com informações sobre o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, que visa à divulgação do direito do acesso como fundamento da democracia. O fórum conta com campanhas e iniciativas de 20 entidades, e dentre elas estão a Abraji e o Artigo 19.

De acordo com Paulino, é responsabilidade dos repórteres pesquisar e ir além do que se obtém através de releases e coletivas. Maíra afirma que "já está havendo mudança cultural, os jornalistas estão publicando a cobrança feita perante os órgãos públicos, mas é preciso explorar mais esse caminho". "A mídia não cobre ela mesma, falta aos jornalistas quererem fazer esse trabalho, e não se alto censurarem", concluiu Katherine Funke.

Livro-reportagem

Renata Ferri
 
A apresentação sobre livro-reportagem consistiu em uma tranqüila e elucidativa conversa com o jornalista e escritor Lucas Figueiredo, a editora Luciana Villas Boas, e o também jornalista escritor e diretor da Abraji Fernando Molica.

"O jornal é uma coisa passageira, mas o livro fica", afirmou Molica já no início da palestra. Para o diretor da Abraji, outra diferença entre o livro-reportagem e o jornal é a autoria.

Segundo ele, no livro o autor é o único responsável por aquilo que escreve e, no jornal, ele divide isso com a empresa para qual trabalha. Apesar das tiragens de livro no Brasil serem pequenas, a matéria publicada no jornalismo diário passa, e o livro permanece, para o bem, ou para o mal, reflete o jornalista. 

De acordo com Molica, o espaço do livro é onde o repórter, o jornalista está livre para se aprofundar em um determinado tema, sem as restrições impostas pela rotina de uma redação.

Lucas Figueiredo contou a trajetória que o levou à publicação de seu primeiro livro-reportagem, Morcegos Negros. Ele disse que nunca tinha pensado em tornar-se escritor até encontrar-se envolvido com um caso que seria uma boa pauta para um livro-reportagem. A morte de PC Farias.

"O jornal não conta a história, apenas empilha informações", afirmou Figueiredo. A produção de um livro- reportagem, de acordo com ele é um investimento que leva anos, no qual é preciso prestar atenção em cada detalhe das situações e hábitos dos personagens. Além disso, na visão dele, o jornalista que se aventura na construção de um livro-reportagem deve ter compromisso com a verdade e não ter muitas expectativas de retorno financeiro.

Luciana Villas-Boas trouxe informações de que a literatura de não-ficçao é o gênero mais rico e prolífico que existe atualmente. De 2001 a 2008, a editora Record publicou 35 livros-reportagem brasileiros. Existem muito mais leitores de não-ficção do que dos demais gêneros, e, de acordo com Luciana, isso se dá porque o Brasil não têm suficiente incentivo à cultura, o que faz com que a imprensa forme os profissionais do texto. "Para os jornalistas escritores, a publicação de um livro é uma realização profissional", diz Luciana.

De acordo com os palestrantes, um problema que assombra todos aqueles que publicaram, ou desejam publicar um livro- reportagem, são os processos judiciais que freqüentemente são movidos contra os autores e a editora.

O compromisso do jornalista com a verdade acaba sendo prejudicado, pois há vários fatores que o levam a temer a publicação. Os palestrantes falaram de ameaças de morte, censura prévia, e da massa de advogados que está em busca de gerar processos sobre qualquer fator com o qual o personagem retratado discorde.

No Brasil, esses processos acontecem também da parte da família de pessoas que já morreram. A solução, na visão deles, é que a mídia deve pautar e divulgar mais o assunto da falta de liberdade de expressão que vem ocorrendo com relação aos livros-reportagem.

Terrorismo da Al-Qaeda e os ataques de 11 de março em Madri

Henrique Naves
Maria Rita Reis

No dia 11 de março de 2004, um grupo local da Al-Qaeda implantou 13 bombas em 4 vagões do metrô de Madri, deixando 192 mortos e mais de 3 mil feridos. Foi o primeiro ataque terrorista bem sucedido na Europa, após diversas tentativas frustradas.

José María Irujo, redator-chefe de investigação do jornal espanhol El País e estudioso do jihadismo desde 1999, explicou para uma atenta platéia que a Espanha é, inegavelmente ,um alvo da rede terrorista internacional mais famosa do mundo, a Al Qaeda. Para ele, se antes isso se devia ao fato do governo de Aznar apoiar a guerra do Iraque, agora acontece em virtude da presença de tropas espanholas no Líbano e no Afeganistão. As ameaças constam nos comunicados de Ayman Al Zawahiri, número 2 da Al Qaeda.

Irujo alerta para o perigo iminente que ronda a Espanha. Ele acredita que a vulnerabilidade demonstrada, assim como a beligerância do sistema policial e judicial espanhol contra as células terroristas, tenha aumentado o risco de um ataque. Desde o 11 de setembro de 2001, a Espanha é o país europeu no qual o maior número de supostos jihadistas foram detidos (325 pessoas), julgados e condenados. Ele afirma que a jihad na Europa não é uma fantasia: “é uma séria ameaça com a qual vamos conviver durante esta e as próximas gerações”.

Segundo o palestrante, os fatos que contribuem para o foco terrorista na Espanha são a posição geográfica do país, ponte entre a África e a Europa, a sua própria história, intimamente ligada ao Islã, e o crescente fenômeno da imigração, que converteu o país em uma das bases mais importantes da Al Qaeda e seus grupos associados na Europa.

Estudos dos discursos de Bin Laden foram a evidência utilizada pelo jornalista para mostrar que o terrorista está, há anos, obcecado com a expansão da guerra santa a novos territórios fora dos cenários tradicionais dos conflitos muçulmanos.

Abdalá Azzam, uma figura que tem forte influência sobre Bin Laden e foi o ideólogo dos árabes afegãos que lutaram contra os soviéticos, defende que a jihad no Afeganistão foi apenas o início de uma batalha que devia se estender por todos os territórios que haviam sido parte da nação muçulmana.

Em seus escritos ele cita Palestina, Líbano, Somália, Birmânia, Yemen do sul e Andalucía, entre outros. Irujo lembra que nos combatentes foi embutido o desejo de martírio em troca do perdão de todos os pecados deles e aos suicidas foi prometido o paraíso, no qual 72 virgens o esperariam e para o qual eles poderiam levar 70 membros de sua família.

O ano de 1998 foi quando se constitui a Frente Islâmica Internacional para a jihad contra judeus e cristãos, na qual se integraram grupos terroristas de diversos países. Segundo Irujo, seu objetivo era internacionalizar a jihad e juntar os esforços de todos na mesma direção. Na cidade afegã de Khost, houve um manifesto público em que se dizia: “todo muçulmano tem o dever de matar os norte-americanos e seus aliados, tanto militares quanto civis, onde seja possível”.

O espanhol explicou ainda que, durante seus anos no Afeganistão, Bin Laden conseguiu ganhar o apoio de grupos terroristas do Norte da África, os quais ele financiou, e dos Sírios da Irmandade Muçulmana, a quem emprestou seus campos de treinamento.

O jornalista diz que esses homens e os ex-mujahidins que lutaram nos campos militares da Bósnia, Chechênia, Indonésia e Afeganistão, regressaram à Europa como imigrantes normais, criando células adormecidas à espera de uma ordem e objetivo. A internet se tornou o principal instrumento de captação da Al-Qaeda e seus associados. A maioria dos detidos por sua implicação em o 11 de março estavam conectados a algumas das 42.000 páginas jihadistas que existem na rede, informa Irujo.

O espanhol aponta a invasão do Iraque como “a maior escola de terroristas do planeta, um foco de ódio de conseqüências imprevisíveis para a Europa”. O micro financiamento é outra característica do sistema jihadista. Irujo diz que grande parte do financiamento é feito por meio de atividades delinqüentes. Os explosivos de 11 de março foram conseguidos através da troca de uma carga de haxixe.

Nesse ponto, o palestrante faz uma crítica à política de contra terrorismo da Espanha. Ele afirma que após os ataques de 11 de setembro toda a Europa multiplicou seus agentes dos serviços policiais - só o Reino Unido contratou 500 novos agentes - e elaborou um censo dos ex-mujahidins que viviam em seu território, elegendo os mais perigosos e os vigiando.

Já a Espanha seguiu com sua “estrutura de brinquedo”. Não se sabiam quantos mujahidins moravam no país, não haviam tradutores árabes e apenas 140 homens estavam encarregados de investigar islamistas radicais. Todos os esforços estavam voltados para a luta contra o ETA, a organização terrorista que atacou a Espanha durante os últimos 30 anos.

Entre governo, oposição e sociedade, os poucos que deram atenção ao tema antes dos ataques, foram considerados pela opinião geral como “loucos ou oportunistas”. Quase ninguém acreditava na ameaça do jihadismo.

Após os ataques, quando todos os indícios levavam a crer que os ataques tinham sido feitos por grupos islâmicos radicais, o governo continuou a afirmar que o foco principal das investigações era o ETA. A isso, a essa falta de transparência com o público, Irujo atribui a perda das eleições que ocorreram dias após os ataques. Anos após os atentados, o jornal El Mundo imprimiu teorias da conspiração à respeito dos ataques, chegando a dizer que foi a polícia espanhola quem implantou as bombas. Isso, Irujo credita à falta de ética de um jornal que em vez de se portar como um guardião da verdade, publica histórias fantasiosas para vender cópias.

Irujo conclui dizendo que afirmar que a implicação do governo anterior com a invasão do Iraque foi a causa dos ataques à Madri é uma visão simplista da situação. Pensar que a Espanha está mais livre de ameaças agora que as tropas foram retiradas do Iraque, é uma ingenuidade.

Assinatura Abraji