2022 supera recorde de ataques à imprensa registrado no ano anterior
  • 18.11
  • 2022
  • 15:47
  • Rafaela Sinderski

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2022 supera recorde de ataques à imprensa registrado no ano anterior

Com níveis críticos de violência contra a imprensa brasileira, 2022 não precisou de seus 365 dias para superar o recorde de agressões contra comunicadores registrado em 2021. Dados parciais do monitoramento de ataques à imprensa, realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), revelam 504 casos identificados entre 1º.jan.2022 e 17.nov.2022 – um aumento de 11,3% em relação a todo o ano passado (453). O número gera uma média de 10,9 episódios por semana neste ano, contra os 8,7 casos semanais de 2021.

Dentro desse cenário brutal, os ataques graves aumentaram em proporções preocupantes. Entre o início de janeiro e meados de novembro, a Abraji registrou 153 situações envolvendo agressões físicas, intimidações, ameaças e apreensão e/ou destruição de equipamentos. Também houve dois assassinatos ligados à atividade jornalística – o de Givanildo Oliveira, em fev.2022, e o de Dom Phillips, em jun.2022. Esse total representa um crescimento de 89% em comparação com os casos graves identificados no mesmo período do ano anterior. A Abraji já havia sinalizado o agravamento da violência contra os jornalistas brasileiros em 2022, mas novos patamares foram alcançados no contexto das eleições.

Ataques no período eleitoral

A violência política que tem marcado o contexto brasileiro, em especial neste ano, também atingiu os comunicadores do país. Dos ataques totais contra jornalistas, meios de comunicação e imprensa de modo geral, 30% estão relacionados às eleições e seus desdobramentos. Os últimos dias de outubro e as primeiras semanas de novembro caracterizam-se por altos índices de agressões, intimidações e hostilização contra a categoria. Mais de 50 casos foram registrados nessa janela temporal, conectados, sobretudo, aos atos antidemocráticos em reação à vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com mais de 59,5 milhões de votos.

Agentes ligados ao Estado brasileiro têm um papel de destaque no quadro de violência contra a imprensa, já que 58% dos ataques gerais deste ano tiveram a participação direta de atores políticos, forças policiais ou outros servidores públicos. Em 43,3% das agressões, os autores não puderam ser identificados. Esse segundo grupo, que inclui internautas e manifestantes, aumentou nas últimas semanas devido aos ataques perpetrados por cidadãos que não aceitam a derrota de Jair Bolsonaro (PL) nas urnas.

Ainda que os casos graves tenham se destacado pelo crescimento vertiginoso, 62% dos ataques à imprensa brasileira são classificados como discursos estigmatizantes. Essa forma de violência verbal tem o objetivo de descredibilizar jornalistas, meios de comunicação e o jornalismo profissional de forma mais ampla. A internet também se estabelece como uma arena de ofensas e campanhas sistemáticas contra comunicadores: 61,5% dos casos totais de 2022 tiveram origem ou repercussão on-line.

Violência de gênero

O monitoramento da Abraji identificou 122 ataques que vitimaram mulheres jornalistas entre 1º.jan.2022 e 17.nov.2022, um aumento de 27,1% em relação ao mesmo período de 2021. O valor também representa 42,2% das 289 agressões registradas contra pessoas comunicadoras. Setembro já havia estabelecido um recorde para ataques a mulheres jornalistas. Esse recorde se mantém, com 28 alertas ao longo do mês, quase um por dia.

Considerando todos os casos do ano, estima-se que 7% contenham expressões explícitas de violência de gênero, com a instrumentalização da identidade de gênero, sexualidade e/ou aparência para oprimir. Além disso, do total de 2022, 1,4% dos alertas são casos de violência sexual, incluindo assédio, importunação e ameaças de estupro. Esses episódios atingem mulheres cisgêneras heterosexuais, como também pessoas comunicadoras que se identificam com a comunidade LGBTQIA+. Em nov.2022, uma repórter da TV A Crítica foi atacada por manifestantes bolsonaristas em Manaus. Impedida de realizar seu trabalho, ela sofreu tentativas de agressão física e ofensas homofóbicas e misóginas.

Cenário sem precedentes

Todos esses dados estabelecem 2022 como o ano mais violento contra a imprensa e seus profissionais desde o início do monitoramento feito pela Abraji. Em 2019, primeiro ano da coleta sistemática de dados, foram registrados 130 ataques. Houve um salto de 287,7% entre aquele período e o momento atual.

É importante frisar que os números apresentados nesta matéria são parciais. Eles podem sofrer ajustes até o fim deste ano, com a exclusão de casos ou a inclusão de alertas que ainda não foram identificados ou apurados pela equipe.

Sobre o monitoramento

Desde 2013, a Abraji acompanha e se manifesta a respeito das agressões sofridas por jornalistas e meios de comunicação em sua função de informar a sociedade. Em 2019, esse trabalho ganhou sistematicidade com a participação da entidade na rede Voces del Sur, que reúne 14 organizações latino-americanas da sociedade civil na tarefa de monitorar violações da liberdade de imprensa a partir de uma metodologia compartilhada. O propósito do acompanhamento é verificar os avanços dos países da América Latina em direção ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 16.10.1 da Agenda 2030 da ONU.

Todos os resultados, inclusive os do Brasil, são registrados no Relatório Sombra publicado anualmente pela rede. O documento de 2021 já está disponível em espanhol. Também é possível verificar a situação brasileira de maneira mais detalhada no relatório “Monitoramento de ataques a jornalistas no Brasil”, produzido pela Abraji.

Além de monitorar as agressões gerais à imprensa, a Abraji acompanha e registra os casos de violência de gênero que atingem jornalistas no Brasil. Os achados de 2021 e os dados parciais de 2022 podem ser encontrados no site do projeto.
 

Assinatura Abraji