Jornalista de Cuiabá é alvo de ação criminal por publicação de reportagem
  • 30.01
  • 2023
  • 15:00
  • Abraji

Liberdade de expressão

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Jornalista de Cuiabá é alvo de ação criminal por publicação de reportagem

Foto de capa: Captura de tela da reportagem que motivou o processo.

O jornalista Rogério Florentino, de Cuiabá (MT), é mais um alvo de ações judiciais abusivas com o intuito de prejudicar a atuação da imprensa. Florentino está respondendo a uma demanda criminal movida pelo empresário Pedro Eugênio Gomes Procópio da Silva, proprietário de duas empresas do setor da mineração que operam na cidade, a Ofir Intermediações de Cuiabá Ltda e a Fênix DTVM. 

Uma queixa-crime foi apresentada pelo empresário contra a reportagem “Governador estuda fechar acordo com empresário investigado pela PF”, publicada por Florentino em seu site Conexão MT. A defesa de Procópio afirma que o título e o texto da matéria seriam injuriosos e teriam causado um dano moral ao empresário por dizer que ele seria investigado pela Polícia Federal. O pedido é pela condenação do jornalista às sanções penais pelo crime de injúria e de maneira aumentada por ter sido cometido diante de várias pessoas, além da fixação de um valor de reparação pelos danos morais. 

A reportagem tem como ponto de partida uma reunião que ocorreu entre o empresário autor da ação e o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes. A partir disso, reúne informações sobre processos judiciais em que as empresas e o empresário estão envolvidos, citando trechos de documentos jurídicos, além de contextualizar questões societárias da empresa e a sua relação com o governador Mauro Mendes. 

Após a publicação da matéria, a assessoria do empresário entrou em contato com o veículo e encaminhou uma nota com argumentos sobre os fatos tratados no texto jornalístico e destacando que o empresário não é investigado pela Polícia Federal. A defesa do autor sustenta que apenas a Ofir Intermediações de Cuiabá Ltda é parte da investigação, e que seu nome aparece uma vez, como parte do quadro societário da empresa. O jornalista incluiu a nota ao final da reportagem e fez constar no início do texto a informação explicando tal atualização. 

A defesa do jornalista, feita pelo escritório Flora, Matheus e Mangabeira, destaca que a matéria foi baseada em documentos públicos obtidos de processo judicial que tramita sem nenhum sigilo no TRF-1, além de informações extraídas de bancos de dados públicos como o da Receita Federal. 

Os advogados confirmam as informações veiculadas na reportagem quanto à inclusão das empresas e do empresário em processo judicial que conta com a investigação da PF, e explica que o sequestro e bloqueio patrimonial que foi deferido e posteriormente revogado, porque o juiz entendeu que a continuidade da atuação das empresas não teria um efeito negativo sobre o andamento do processo. 

A defesa prévia de Florentino, que ainda não foi apreciada pelo juiz do caso, sustenta que a acusação fere o direito constitucional da liberdade de expressão e de imprensa. Destaca que a reportagem cumpriu os trâmites necessários uma vez que tomou o cuidado de ouvir o contraditório e não apresenta nenhuma intenção de ofender. Foi apresentado ainda um parecer da organização internacional Media Defence que detalha o regime da proteção da liberdade de expressão ferida pela demanda.

Assédio judicial no Mato Grosso

O jornalista Rogério Florentino está incluído na Rede de Proteção aos Jornalistas do Instituto Vladimir Herzog, que se manifestou publicamente sobre o caso, classificando como mais um episódio de assédio judicial. Sem uma definição única, o assédio judicial tem sido entendido como o uso abusivo do direito de ação para cercear a liberdade de expressão e de imprensa.

O advogado que representa Procópio nesta ação também é o representante do atual governador do estado do Mato Grosso, Mauro Mendes, em diversas ações, inclusive aquelas movidas contra outro jornalista da região, Alexandre Aprá. O jornalista denuncia que, por conta de reportagens que fez analisando as ações do governador, passou a ser perseguido por ele e pela primeira-dama, Virgínia Mendes. 

Em um primeiro momento, Aprá foi alvo de diferentes processos movidos tanto pelo político e sua esposa como por outros agentes públicos de seu governo. O então secretário de estado Mauro de Carvalho já moveu duas ações, cível e criminal, contra o jornalista por publicações em seu site Isso É Notícia. Em uma delas, Aprá tem o apoio do Programa de Proteção Legal para Jornalistas, da Abraji, para custear os gastos com sua defesa. 

O assédio no caso de Aprá não ficou restrito à seara judicial. Em 2021, o jornalista relatou que passou a ser alvo de novas ameaças. Naquele momento, ele recebeu de um infiltrado a informação de que o governador e a esposa teriam contratado um detetive particular para incriminá-lo e que sua vida havia sido colocada em risco. 

Recentemente, a Agência Pública publicou uma reportagem que detalhou os áudios coletados pelo infiltrado, que é um jornalista investigativo e segue com sua identidade preservada por questões de segurança. 
 

Assinatura Abraji